Nestlé distribui produtos com açúcar adicionado para países pobres, aponta relatório Bruno Mello 19 de abril de 2024

Nestlé distribui produtos com açúcar adicionado para países pobres, aponta relatório

         

Constatação foi feita em um estudo conduzido pela ONG Public Eye, que aponta discrepâncias entre o discurso e a prática de distribuição da empresa suíça

Nestlé distribui produtos com açúcar adicionado para países pobres
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Um relatório recém-publicado pela ONG Public Eye em parceria com a Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar (IBFAN) sugere que a Nestlé está seguindo um perigoso e incoerente padrão de distribuição de suplementos alimentares infantis para os mercados aos quais atende.

Pesquisadores que participaram da investigação liderada pela ONG descobriram elevados índices de açúcar adicionado às composições das linhas Cerelac e Nido, comercializadas no Brasil como Mucilon e Ninho, respectivamente.

Curiosamente, no entanto, estes índices só aparecem na fórmula dos produtos distribuídos para países de médio e baixo rendimento, conhecidos geograficamente como “Países do Sul” ou “Subdesenvolvidos” – rótulos geopolíticos que incluem o Brasil.

Assim, enquanto na Suíça, o berço da Nestlé, as linhas Cerelac e Nido são comercializadas sem açúcar adicionado à composição, versões vendidas em países como Senegal e África do Sul contêm pelo menos seis gramas de açúcar adicionado por porção.

No Brasil, seis dos oito produtos da linha Mucilon possuem pelo menos 3,0 g de açúcar adicionado à composição. Por aqui, as embalagens não oferecem aos consumidores quaisquer informações sobre a adição do ingrediente, que não foi encontrado nos produtos nacionais da linha Ninho.

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Uma incoerência comunicacional

A discrepância denunciada pela Public Eye faz pairar um grande ponto de interrogação sobre as práticas comunicacionais. Ao longo dos anos, o Marketing da Nestlé envernizou a dupla de produtos como marcas fabricadas para ajudar as crianças a levar uma vida mais saudável, contribuindo tanto para o fortalecimento do sistema imunológico dos pequenos, quanto para o desenvolvimento cognitivo.

Esta narrativa, contudo, cai por terra quando confrontada pela insalubridade do açúcar adicionado às fórmulas: há um ano, um estudo publicado na revista The BMJ, conduzido por pesquisadores chineses e estadunidenses, apontou que o consumo de açúcar adicionado está associado a pelo menos 45 problemas de saúde, como diabetes, obesidade, pressão alta, câncer e morte precoce.

Apoiado por estratégias de Marketing e embalagens que pregam a saudabilidade por evidenciar as vitaminas e os minerais na fórmula do produto, o Cerelac é, atualmente, a principal marca de cereais infantis em todo o mundo, tendo registrado vendas superiores a um bilhão de dólares em 2022, conforme apontam dados divulgados pelo Euromonitor.

Em seu site, a própria Nestlé reconhece os riscos do açúcar e recomenda que os pais evitem oferecer o ingrediente aos filhos durante a infância, já que o sabor doce pode influenciar a preferência da criança por esse tipo de alimento no futuro.

Questionada pela ONG, a empresa se limitou a elencar feitos como a redução da quantidade total de açúcares adicionados em seu portfólio global de cereais infantis em 11%” na última década, e destacou que continuará a fazê-lo, sem comprometer a qualidade, a segurança e o sabor dos produtos.

 

Procurada pela equipe do Mundo do Marketing para comentar o relatório, a Nestlé informou: “Acreditamos na qualidade nutricional dos nossos produtos para a primeira infância e priorizamos a utilização de ingredientes de alta qualidade e adaptados ao crescimento e desenvolvimento das crianças. Aplicamos os mesmos princípios de nutrição, saúde e bem-estar em todos os lugares onde operamos. As categorias de alimentos infantis são altamente regulamentadas. Nosso portfólio segue tais regulamentações locais (ANVISA) e/ou padrões internacionais (OMS), incluindo requisitos de rotulagem e limites de carboidratos – que incluem açúcares. Além disso, declaramos os açúcares totais e adicionados dos nossos produtos.

Durante a última década, reduzimos em 11% a quantidade total de açúcares adicionados no nosso portfólio de cereais infantis em todo o mundo. Também continuaremos inovando e reformulando nossos produtos para reduzir ainda mais o nível de açúcares adicionados sem comprometer a qualidade, a segurança e o sabor. No Brasil, Mucilon possui em seu portfólio itens sem e com açúcares adicionados, de acordo com os limites estabelecidos como seguros pela ANVISA. Já Ninho não contém açúcares adicionados como sacarose e xarope de glicose.

Variações nas receitas entre países dependem de vários fatores, incluindo regulamentos e disponibilidade de ingredientes, por exemplo, e não comprometem a qualidade e a segurança dos nossos produtos.
Apoiamos a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de amamentação exclusiva durante os primeiros seis meses de vida, seguida pela introdução de alimentos complementares adequados, juntamente com a amamentação sustentada até aos dois anos de idade ou mais”, finalizou o comunicado.

 

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