Quem comanda as decisões de consumo? 5 de julho de 2007

Quem comanda as decisões de consumo?

         

Quem comanda as decisões de consumo?

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<p><strong>Quem comanda as decisões de consumo? </strong></p><p>Por Paulo Vieira de Castro*</p><p>Alguns mecanismos de tomada de decisão em ambientes de comportamento motivado estão já catalogados pelas neurociências, sendo muitas empresas que se debruçam  sobre o mais complexo paradigma do comportamento humano; o consumo. Esta investigação é suportada, desde há vários anos, por modernas tecnologias psicológicas e por máquinas de uso convencional na medicina, como a tomografia ou a ressonância magnética. Ligar indivíduos a máquinas de scanner cerebral, ao mesmo tempo que  observam marcas, videoclips publicitários, discursos políticos, traillers cinematográficos, etc., é um procedimento que permite aos pesquisadores observar a excitação que ocorre ao nível dos circuitos cerebrais. Um dos objetivos destas experiências passa pela tentativa de descodificar os mecanismos de fidelização de grupos de consumidores alvo.</p><p>Grande parte das motivações que levam à compra partem do inconsciente humano, assim, num futuro próximo, os métodos tradicionais de estudo do comportamento do consumidor serão substituídos pelo scanner da mente, permitindo, do ponto de vista da aplicação neuroeconómica, investigar questões como a satisfação, a ganância, o altruísmo, a raiva ou o medo. </p><p>No futuro, muitas das maiores organizações terão um departamento de neurociências, cuja importância será determinante na investigação mercadológica, tornando-se uma importante ferramenta de suporte do processo de decisão estratégica, destacando-se como uma potente técnica de inquérito. Compreender parte das emoções vividas durante as experiências de consumo, só foi possível colocando a neurociência ao serviço de organizações multinacionais, surgindo deste encontro o neuromarketing, que nada mais é do que o estudo neurológico do estado mental dos indivíduos, quando expostos a mensagens relacionadas com experiências de consumo.</p><p>Desde o ano de 2001 que o scanner da mente tem vindo a ser utilizado um pouco por todo o mundo. O processo, na prática, é muito simples de entender, pretendendo-se que os investigadores possam identificar as partes do cérebro que são estimuladas durante as experiências de consumo, descodificando padrões de comportamento inconscientes. Observar os campos elétricos do cérebro torna-se mais credível que o processamento estatístico, realizado em torno de questionários tipo ou de entrevistas de grupo. </p><p>A razão que fundamenta esta moderna e potente ferramenta de análise relaciona-se com a idéia que a linguagem se desenvolve a partir de si mesma, ou seja, o que eu falo funciona, tantas vezes, ao revés do que penso. As dúvidas que se levantam para os analistas de marketing prendem-se com a possibilidade de as respostas aos questionários não serem sinceras, ou mesmo, com a hipótese de em sessões de grupo existir a probabilidade de um, ou mais, de entre os entrevistados, tentarem influenciar a restante amostra.</p><p>Vários estudos da área das neurociências confirmam o que há muito se desconfiava relativamente à relação que estabelecemos com o consumo. Este é, segundo Montagne, do Baylor College of Medicine (EUA), tudo menos racional. As experiências de Montagne tornaram-se clássicos do neuromarketing, apontando as decisões de consumo como ligadas ao comportamento meramente emotivo. Ao realizar os já clássicos testes cegos com os populares refrigerantes Coca-Cola e Pepsi, foi possível evidenciar as zonas do cérebro que são responsáveis pela influência inconsciente durante experiências de consumo. Quando os voluntários sabiam que estavam bebendo Coca-Cola, independentemente da sua preferência pela marca, acendiam-se as zonas do cérebro onde se movimentam as emoções e o afeto. Se este mesmo grupo de indivíduos bebia Coca-Cola por copos não identificados, as zonas do cérebro, anteriormente identificadas, não se iluminavam.</p><p>Concluiu-se que neste caso a preferência da amostra estava relacionada com a identificação da marca e não com o sabor. A relação psicológica, emocional, cultural, etc., que temos com os produtos, suplanta os valores que nos são transmitidos através do gosto ou do aroma. Não é o paladar que conta, mas a marca, ou a construção inconsciente que dela temos. Um outro exemplo clássico são as experiências realizadas nos EUA a propósito do 11 de Setembro. Analisaram-se os impulsos elétricos cerebrais de republicanos e democratas quando confrontados com imagens de terror relacionadas com os atentados deste fatídico acontecimento. </p><p>A área do cérebro associada ao medo acendia-se mais vivamente nos democratas convictos que nos republicanos. O neuromarketing permite, igualmente, analisar decisões de investimento. Clássicos são, igualmente, os estudos que mediram a atividade cerebral de homens e mulheres enquanto jogavam o Investiment Game. Curioso é observar que a atividade cerebral dos homens é substancialmente reduzida a partir do momento em que tomam a decisão, ao contrário das mulheres, que demonstram uma atividade cerebral contínua em três áreas distintas: uma, que concentra a recompensa, outra que tem a ver com o planejamento e a organização, e uma última área onde se calcula e monitoriza as desordens obsessivas-compulsivas. </p><p>O reconhecimento de tais diferenças em pouco ajudam ao entendimento a propósito do impulso primordial que comanda homens e mulheres em momentos de consumo. As limitações do neurobusiness são evidentes, já que este não consegue prever as mudanças de comportamento, assim como não lhe é possível mudar as convicções dos consumidores. Dado que se trata de uma técnica descritiva, não destrutiva, pensada para analisar o comportamento do cérebro, não pode induzir comportamentos nos consumidores. O neuromarketing mapeia o processo mental em torno dos benefícios  que poderão levar o cliente a comprar uma determinada marca; todavia, não o pode obrigar a consumir.</p><p>O neurobusiness é freqüentemente confundido com outras aplicações tecnológicas ao nível cerebral. Referimo-nos, em especial, à e-terapy. Trata-se de técnicas psicológicas, associadas a software especializado, cujo principal objetivo passa por reprogramar o cérebro humano de forma a fazê-lo esquecer traumas, medos, dores crônicas, iludindo alguns dos estados de espírito mais indesejáveis. Alguns críticos estimam que, no futuro, estas tecnologias poderão ser usadas para estimular a atividade em zonas do córtex associadas a emoções ou, ainda, para aumentar ou diminuir a tensão ao nível do impulso racional, envolvendo o consumidor em estados emocionais propícios a determinados hábitos de consumo. </p><p>Uma outra possibilidade de influência tecnicamente assistida do comportamento humano, salientada pelos críticos do neurobusiness, prende-se com os chips que são já aplicados de forma promissora em cérebros de doentes com Parkinson, ou com traumas ao nível obsessivo-compulsivo. Seria eticamente reprovável que estas tecnologias fossem utilizadas com outros propósitos que não os médicos.</p><p>Há muitos anos que algumas empresas de comunicação começaram a desenvolver esforços no sentido de atingir a mente dos consumidores através de programação dedicada ao subconsciente. Talvez este motivo seja suficiente para refletirmos a propósito das intenções que estão por detrás de algumas mensagens publicitárias.<br />Atualmente, existe uma corrente de opinião que dá conta de um novo horizonte da decisão humana, levantando-se a possibilidade dos segredos das decisões de consumo poderem estar associados ao sistema primário da motivação inconsciente. Assim, longe da expressão do exclusivo interesse racional do ser humano, ou do campo emocional, torna-se prioritário o estudo da emancipação das regiões mais primitivas do cérebro.</p><p>Os mecanismos humanos de decisão poderão genericamente estar relacionados com três áreas distintas do cérebro com funções diferenciadas. Resumidamente poderemos referir a existência de um cérebro novo, de um cérebro do meio e de um velho cérebro. O cérebro novo será responsável pelas áreas da investigação, da lógica e da dedução. Logicamente, qualquer um será capaz de deduzir que não é prudente viajar de automóvel ao dobro da velocidade aconselhada por lei (exercício projetado no novo cérebro); contudo, há muita gente a fazê-lo sob pena de colocar várias vidas em perigo. O mesmo poderemos dizer quanto às decisões de consumo. Quantas são tomadas de forma inexplicável? Estes exemplos remetem-nos para a necessária existência de outros campos cerebrais para além do racional. </p><p>Assim, para além do novo cérebro, reconhece-se o cérebro do meio, onde vamos encontrar as emoções e os sentimentos. Aqui são ainda partilhadas as suas descobertas com os outros dois cérebros. Existe, igualmente, o velho cérebro, o mais profundo, o responsável por nos mantermos vivos. Aqui poderemos encontrar o que Jung relacionou com a herança histórica de todas as civilizações. O cérebro reptilário, o dos nossos antepassados, poderá ser grandemente responsável pelas decisões de consumo. Assim, chegar ao cérebro primitivo permitir-nos-á compreender os próprios mecanismos de sobrevivência humana e conseqüentemente avançar no conhecimento sobre a evolução da humanidade.</p><p>Será que é ao nível do velho cérebro que vamos encontrar a mais antiga mistificação dos publicitários, aquilo a que estes chamam de buy botton? Talvez o ser humano não tenha nascido para consumir; no entanto, será interessante estudar a possibilidade de existir no Homem um impulso natural de poder, que o empurre, em direção ao consumo, isto como forma manifesta de disputa do poder pela compra.</p><p>*Paulo Vieira de Castro é Diretor do Centro de Estudos Aplicados em Marketing do Instituto Superior de Administração e Gestão do  Porto – Portugal. Ele também atua como consultor de empresas. É mestre em markting e professor do Ensino Superior. Contato: <a href="mailto:[email protected]">[email protected]</a> ou <a href="http://www.paulovieiradecastro.com" target="_blank">www.paulovieiradecastro.com</a></p>


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