<p><strong>Produtos comuns, expectativas premium</strong></p><p>Por Andr&eacute; Cauduro D&rsquo;Angelo*</p><p>N&atilde;o raro empresas de diversos ramos se deparam com um aparente paradoxo. Detentoras de marcas destinadas a targets distintos &ndash; um, convencional; outro, de alta renda &ndash;, resolvem aferir os n&iacute;veis de satisfa&ccedil;&atilde;o de seus clientes de cada categoria. E descobrem, n&atilde;o sem surpresa, que os clientes da marca &ldquo;premium&rdquo; est&atilde;o menos satisfeitos que os da marca comum, quando n&atilde;o simplesmente insatisfeitos com o produto ou servi&ccedil;o dito &ldquo;top de linha&rdquo; da companhia. </p><p>V&aacute;rios bancos brasileiros j&aacute; enfrentaram (e enfrentam) essa situa&ccedil;&atilde;o. O correntista comum avalia bem o servi&ccedil;o que recebe; j&aacute; o cliente de alta renda, que faz parte de categorias apelidadas com nomes pomposos, tem percep&ccedil;&atilde;o negativa sobre os servi&ccedil;os. </p><p>Os executivos se surpreendem. Enquanto o correntista comum enfrenta filas nas ag&ecirc;ncias e/ou tem contato apenas com impessoais terminais de auto-atendimento, o cliente preferencial ganha aten&ccedil;&atilde;o de um gerente de conta, freq&uuml;enta ag&ecirc;ncias bonitas e bem decoradas, bebe champanhe e desfruta de uma s&eacute;rie de benef&iacute;cios que os bancos se esmeram em propagandear. </p><p><strong class="texto_laranja_bold">Por que, ent&atilde;o, &ldquo;teima&rdquo; em se dizer insatisfeito?</strong></p><p>A resposta passa pela compreens&atilde;o do conceito de expectativas. Expectativas s&atilde;o as cren&ccedil;as que o consumidor alimenta antes da utiliza&ccedil;&atilde;o do produto/servi&ccedil;o, podendo abranger tanto aspectos de natureza tang&iacute;vel e funcional, quanto intang&iacute;vel e emocional. &Eacute; a confronta&ccedil;&atilde;o entre expectativas do cliente com performance do produto ou servi&ccedil;o que determina se o consumidor ficar&aacute; satisfeito com o que comprou e usou. Como mostra o gr&aacute;fico, desempenho inferior &agrave;s expectativas resulta em insatisfa&ccedil;&atilde;o; desempenho igual &agrave;s expectativas resulta em satisfa&ccedil;&atilde;o. J&aacute; o chamado &ldquo;encantamento&rdquo;, que tantos profissionais de marketing dizem perseguir para suas marcas, &eacute; atingido se a performance exceder as expectativas dos clientes.</p><div style="text-align: center"><img src="images/materias/colunas/andre_dangelo_grafico.jpg" border="0" alt=" " title="Comparativo" width="462" height="216" /></div><p>Em mercados competitivos, as expectativas dos clientes tendem a aumentar com o tempo. &Agrave; medida que uma empresa adiciona vantagens e atributos a seus produtos/servi&ccedil;os, as demais acabam por fazer o mesmo. Se n&atilde;o o fazem, correm o risco de desapontar clientes que, por intui&ccedil;&atilde;o, tender&atilde;o a procurar em TODOS os produtos de uma mesma categoria aqueles benef&iacute;cios e caracter&iacute;sticas que, &agrave;s vezes, somente um dos concorrentes oferece. </p><p>A resposta a desafios desta natureza chama-se gest&atilde;o de expectativas. Trata-se de um conceito bastante &uacute;til quando o desafio &eacute; atender clientes de alta renda, principalmente se a experi&ecirc;ncia da empresa adv&eacute;m apenas da atua&ccedil;&atilde;o no mercado massificado. As empresas t&ecirc;m duas alternativas frente &agrave;s expectativas dos clientes: adot&aacute;-las ou mold&aacute;-las.</p><p>A ado&ccedil;&atilde;o das expectativas dos clientes, agregando a produtos/servi&ccedil;os atributos que fazem parte das cren&ccedil;as dos consumidores, deve ocorrer se os custos desta ado&ccedil;&atilde;o forem inferiores aos de n&atilde;o-ado&ccedil;&atilde;o. Ou seja, sempre que a perspectiva de perda de receita for maior que os investimentos necess&aacute;rios para dotar o produto/servi&ccedil;o de um novo feature. Exemplo: embora o servi&ccedil;o central dos hot&eacute;is seja acomoda&ccedil;&atilde;o, &eacute; praticamente inconceb&iacute;vel, hoje, que um estabelecimento deste tipo n&atilde;o ofere&ccedil;a caf&eacute; da manh&atilde;. Este &eacute; um caso t&iacute;pico de expectativas modificadas pela evolu&ccedil;&atilde;o do mercado; no momento em que alguns hot&eacute;is passaram a oferecer o desjejum, os clientes assumiram a perspectiva de que o servi&ccedil;o de hospedagem deveria incluir, tamb&eacute;m, a primeira refei&ccedil;&atilde;o do dia. Para os hot&eacute;is relutantes, n&atilde;o houve sa&iacute;da: era adotar o servi&ccedil;o ou perder clientes. </p><p>Moldar as expectativas dos clientes, por sua vez, diz respeito a tentar influenci&aacute;-los por meio de diversos mecanismos, tais quais a publicidade, o ponto-de-venda e a intera&ccedil;&atilde;o com vendedores. Moldar expectativas &eacute;, essencialmente, uma tarefa intr&iacute;nseca ao posicionamento da marca, a&ccedil;&atilde;o na qual se tenta apresentar o que se deve ou n&atilde;o esperar de determinado produto ou servi&ccedil;o. Se a promessa for modesta frente ao que o produto/servi&ccedil;o pode oferecer, torna-se dif&iacute;cil atrair o consumidor; se for excessiva, por outro lado, conduz &agrave; insatisfa&ccedil;&atilde;o. Exemplo: hot&eacute;is econ&ocirc;micos procuram ser muito claros quanto ao que esperar de seus servi&ccedil;os. N&atilde;o prometem lautos buf&ecirc;s ou funcion&aacute;rios sempre &agrave; disposi&ccedil;&atilde;o; prometem hospedagem correta a pre&ccedil;os compat&iacute;veis. Quem se hospeda num destes estabelecimentos dificilmente ficar&aacute; desapontado por n&atilde;o encontrar 10 tipos de p&atilde;o na mesa do caf&eacute; da manh&atilde;, e provavelmente se dar&aacute; por satisfeito se encontrar um quarto limpo e arrumado no qual dormir. Afinal, suas expectativas j&aacute; foram adequadamente moldadas pelas pr&oacute;prias a&ccedil;&otilde;es de posicionamento da empresa.</p><p><strong class="texto_laranja_bold">Expectativas no mercado de luxo</strong><br />Num setor, especificamente, a gest&atilde;o de expectativas &eacute; delicadamente importante: o de bens de luxo. </p><p>Nele, os pre&ccedil;os elevados explicam-se, em parte, pela excel&ecirc;ncia da mat&eacute;ria-prima e do processo de elabora&ccedil;&atilde;o do produto ou servi&ccedil;o; mas, sobretudo, pelo apelo intang&iacute;vel da marca que o reveste. </p><p>Parte dos consumidores, no entanto, n&atilde;o raro espera de um produto ou servi&ccedil;o de luxo a perfei&ccedil;&atilde;o. Sua toler&acirc;ncia a erros e problemas &eacute; pequena, exigindo repara&ccedil;&atilde;o de supostos danos mesmo quando as garantias legais se esgotam &ndash; como quando pedem a troca de uma mercadoria que apresenta algum defeito anos depois de comprada. </p><p>Neste setor, o posicionamento pouco pode moldar as expectativas dos clientes. Ou, na verdade, pode apenas mold&aacute;-la no que diz respeito a caracter&iacute;sticas abstratas, como estilo e &ldquo;personalidade&rdquo; (a marca ser vista como &lsquo;moderna&rsquo; ou &lsquo;cl&aacute;ssica&rsquo;, por exemplo). Nada informa ou promete quanto &agrave; qualidade e funcionalidade do que vende, em geral. </p><p>Para lidar com essas situa&ccedil;&otilde;es, o mais adequado &eacute; contar com uma equipe de linha de frente bem preparada. Funcion&aacute;rios que atuam diretamente com o consumidor, como vendedores e atendentes, devem ser alertados de que as expectativas dos clientes podem ser infinitas, mas as possibilidades dos produtos e servi&ccedil;os, n&atilde;o. Dom&iacute;nio t&eacute;cnico sobre o produto/servi&ccedil;o &eacute; fundamental, nesse caso; profissionais capazes de argumentar tecnicamente com os clientes certamente t&ecirc;m mais capacidade de persuas&atilde;o e convencimento.</p><p>Gerenciar expectativas de clientes &eacute; atividade cotidiana para os profissionais de marketing &ndash; que, no entanto, nem sempre se d&atilde;o conta disso. A surpresa causada pelos resultados de muitos estudos de satisfa&ccedil;&atilde;o tem mostrado que algumas empresas ainda n&atilde;o se deram conta de que atender consumidores de alta renda, por exemplo, n&atilde;o significa apenas oferecer produtos e servi&ccedil;os diferentes, mas tamb&eacute;m compreender o tipo de expectativa que faz parte do imagin&aacute;rio deste consumidor. Se persistirem ignorando este componente, correr&atilde;o o risco de oferecerem produtos comuns a quem tem expectativas premium, tornando, assim, infrut&iacute;feros seus esfor&ccedil;os de marketing junto a este target. </p><p>* Andr&eacute; Cauduro D&rsquo;Angelo &eacute; consultor em marketing, autor de &ldquo;Precisar, n&atilde;o Precisa &ndash; Um olhar sobre o consumo de luxo no Brasil&rdquo; (Editora Lazuli/Cia. Editora Nacional). <a href="http://www.precisarnaoprecisa.com.br/" target="_blank">www.precisarnaoprecisa.com.br</a>. Contato: <a href="mailto:[email protected]">[email protected]</a></p>
Produtos comuns, expectativas premium
24 de abril de 2007