<p>Por Betty Wainstock e Ricardo de Castro*<br /> <br /> O cliente telefona &agrave;s 16h de sexta-feira.</p> <p style="margin-left: 40px;">- Preciso contratar uma pesquisa.<br /> – Pois n&atilde;o, quando podemos marcar a reuni&atilde;o de briefing?<br /> – Agora mesmo, &agrave;s 17h. Mas precisa ser pelo telefone ou posso te passar por e-mail. Preciso que o campo seja realizado no fim de semana e os resultados apresentados na segunda de manh&atilde;, &agrave;s 9h.</p> <p>Parece piada, mas &eacute; quase realidade. Quem trabalha com pesquisa, planejamento e publicidade entende bem do que estamos falando. Prazos cada vez mais apertados. Press&otilde;es de entrega cada vez mais sufocantes. Cobran&ccedil;as por uma rapidez que se torna incompat&iacute;vel com a qualidade exigida na entrega. Mas por que tanta pressa? Quantas coisas se perdem nesta exagerada cobran&ccedil;a por uma &ldquo;efici&ecirc;ncia&rdquo; que acaba se tornando absolutamente ineficiente?<br /> <br /> &Eacute; claro que em algumas profiss&otilde;es, a pressa &eacute; indispens&aacute;vel. &Eacute; o caso de bombeiros, policiais ou m&eacute;dicos, que precisam de velocidade para atender emerg&ecirc;ncias e salvar vidas. Ou os atletas que competem com velocidade. No entanto, transportando tudo isso para outros tipos de atividade profissional como a nossa, sabemos que se pedimos um prazo de alguns dias adicionais para concluir um trabalho, corremos o risco de sermos taxados de lentos.<br /> <br /> Enquanto especialistas em pesquisa de mercado, acreditamos que os resultados dos estudos contratados devem ser melhor avaliados, mais mastigados e degustados, com tempo h&aacute;bil para se obter insights relevantes que ajudem os nossos clientes a terem uma vis&atilde;o inovadora do que foi pesquisado. Infelizmente, todos os pedidos que chegam &ldquo;s&atilde;o para ontem&rdquo;. Os prazos atropelam a capacidade de se fazer uma leitura profunda do conte&uacute;do, prejudicando assim as an&aacute;lises e o pr&oacute;prio projeto.<br /> <br /> E isso n&atilde;o acontece somente no campo profissional. As crian&ccedil;as e jovens &ldquo;de hoje&rdquo; parecem estar sendo &ldquo;treinados&rdquo; para enfrentar este ritmo acelerado do mercado. Fala-se muito hoje em dia da gera&ccedil;&atilde;o &ldquo;multitarefa&rdquo;, dos jovens que fazem tudo ao mesmo tempo: enquanto estudam para a prova do dia seguinte, teclam com 12 amigos simultaneamente no MSN, ouvindo m&uacute;sica no r&aacute;dio, com a TV ligada, navegando por dez sites diferentes, enquanto o celular est&aacute; em um ouvido e o ipod em outro. <br /> <br /> Diante deste fen&ocirc;meno da &ldquo;multitarefa&rdquo; que invadem impiedosamente nossa rotina e tiram o nosso sono, parece-nos importante compartilhar com os leitores o que o jornalista canadense Carl Honor&eacute; relata em seu livro &ldquo;Devagar &ndash; Como um Movimento Mundial Est&aacute; Desafiando o Culto &agrave; Velocidade (editora Record)&rdquo;. A vontade do autor de abordar este tema surgiu quando ele encontrou um artigo no jornal com o seguinte t&iacute;tulo: &ldquo;Como contar hist&oacute;rias para adormecer os filhos em apenas um minuto&rdquo;. A primeira rea&ccedil;&atilde;o de Honor&eacute; foi de muito interesse, afinal de contas, tudo o que ele precisava naquele momento era aprender como fazer &ldquo;aquilo&rdquo; para agilizar esta &ldquo;tarefa&rdquo; e &ldquo;ganhar tempo&rdquo;. No entanto, quando refletiu um pouco mais a respeito, acabou se dando conta de como isso &ldquo;encurtaria&rdquo; um momento &uacute;nico com as pessoas que mais amava. <br /> <br /> Honor&eacute; pesquisou diversos movimentos da onda &ldquo;Devagar&rdquo;. Descobriu que, na &Aacute;ustria, existe a &ldquo;Sociedade Para a Desacelera&ccedil;&atilde;o do Tempo&rdquo;, no Jap&atilde;o existe o Clube da Pregui&ccedil;a e, na It&aacute;lia, surgiu o movimento Citt&agrave; Slow (cidade lenta) que criou a regra de fechar o centro da cidade ao tr&acirc;nsito um dia por semana para incentivar os passeios a p&eacute;, de bicicleta ou patins, e adotar pol&iacute;ticas estruturais para conservar as caracter&iacute;sticas da cidade. As Cidades Slow procuram preservar o patrim&ocirc;nio gastron&ocirc;mico, criando espa&ccedil;os e ocasi&otilde;es para o contato direto entre consumidores e produtores de qualidade. Existe tamb&eacute;m uma associa&ccedil;&atilde;o internacional muito conhecida, chamada Slow Food, em oposi&ccedil;&atilde;o ao Fast Food. A inten&ccedil;&atilde;o &eacute; fazer com que as pessoas consigam apreciar a boa mesa, com bons vinhos e boa companhia, desfrutando da comida em longas conversas com amigos e familiares. No Brasil, alguns restaurantes j&aacute; aderiram ao conceito de servir pratos tradicionais, feitos sem pressa, com ingredientes de prefer&ecirc;ncia org&acirc;nicos e naturais da regi&atilde;o, num ambiente que estimula a conversa af&aacute;vel e prolongada. <br /> <br /> Outros grupos lutam para que os trabalhadores tenham tempo para suas fam&iacute;lias, como &eacute; o caso do Putting Family First (Colocando a Fam&iacute;lia em Primeiro Lugar) e o Timing for Family (Tempo para a Fam&iacute;lia). Carl Honor&eacute; diz que viver devagar significa nunca se afobar, nunca tentar ganhar tempo s&oacute; para ganhar tempo. Significa manter-se calmo e imperturb&aacute;vel, mesmo quando as circunst&acirc;ncias nos obrigam a apressar as coisas. <br /> <br /> O grande problema &eacute; que as pessoas se sentem culpadas quando &ldquo;desaceleram&rdquo;. Passam a se cobrar sentindo que n&atilde;o est&atilde;o &ldquo;trabalhando o suficiente&rdquo; ou que est&atilde;o simplesmente desperdi&ccedil;ando tempo. Perderam a capacidade de se desligar. Ao contr&aacute;rio, se encontram uma brecha na agenda, em vez de respirarem aliviadas, imediatamente a preenchem com outra atividade. Ningu&eacute;m consegue ficar sem fazer nada s&oacute; para recarregar as baterias. <br /> <br /> Se as pessoas est&atilde;o dirigindo, precisam falar no celular ao mesmo tempo, o que, ali&aacute;s, &eacute; extremamente perigoso. Se est&atilde;o em um restaurante, precisam ler o jornal ou consultar o notebook enquanto aguardam o prato. Se tiram f&eacute;rias, levam em sua mala o computador e doze relat&oacute;rios para colocar em dia. Se v&atilde;o para um hotel afastado de tudo e de todos, buscam est&iacute;mulos para terem &ldquo;o que fazer&rdquo;. O desejo de &ldquo;ganhar tempo&rdquo; &eacute; t&atilde;o doentio que hoje em dia, nos EUA, j&aacute; existem missas f&uacute;nebres drive-thru em que s&atilde;o prestadas as condol&ecirc;ncias aos parentes do morto de dentro do carro. <br /> <br /> Vamos tentar fazer tudo um pouco mais devagar. E absorver as informa&ccedil;&otilde;es que nos chegam com mais qualidade. Fica ent&atilde;o o nosso convite para uma pausa. No campo profissional, uma pausa para planejar em detalhes cada projeto, contratar fornecedores de primeira linha, ter insights diferenciados (sob press&atilde;o ningu&eacute;m gera um brainstorming eficiente), pesquisar com profundidade, reler o material com oito olhos e depois reler novamente com dezesseis olhos.<br /> <br /> No campo pessoal, uma pausa para respirar. Para aprender a meditar. Para se concentrar e se entregar. Para colocar mais energia no presente. Para focar o &ldquo;aqui e agora&rdquo;. Para se conectar com &ldquo;o eu&rdquo; e com os outros. Para conversar mais devagar com aquele amigo que te procurou para pedir um conselho. Para ouvir mais devagar os seus pais que telefonam para saber se tudo est&aacute; bem. Para n&atilde;o apressar os momentos sagrados com os filhos, para beijar mais devagar suas bochechas e abra&ccedil;ar mais devagar a vida, que passa t&atilde;o depressa.<br /> <br /> * Betty Wainstock &eacute; Diretora de Pesquisa de Marketing da Ideia Consumer Insights e professora de Pesquisa Qualitativa do curso Bootcamp, da Escola Superior de Propaganda &amp; Marketing (ESPM). Formada em psicologia pela UFRJ e Doutoranda em psicologia pela PUC-Rio na &aacute;rea de tecnologias, comunica&ccedil;&atilde;o e subjetividade.<br /> <br /> * Ricardo de Castro &eacute; Diretor de Planejamento e Intelig&ecirc;ncia Digital da Ideia Consumer Insights, aprovado para o Doutorado da ECO-UFRJ, sendo Mestre em Comunica&ccedil;&atilde;o Social e Cultura pela ECO/UFRJ, Mestre em Psicologia pela PUC-RIO e MBA pela COPPEAD. &Eacute; Professor de P&oacute;s-Gradua&ccedil;&atilde;o da FGV-Management.</p>
Por que tanta pressa?
10 de novembro de 2010