O que é e o que não é estratégia 23 de maio de 2016

O que é e o que não é estratégia

         

Dedique tempo para pensar estrategicamente. Os executivos devem compreender o que é e o que não é estratégia, principalmente em se tratando das estratégias de desenvolvimento

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Ouvimos falar de 'estratégia' com frequência e nem sempre o termo é devidamente empregado. Muitos empresários e executivos tomam determinadas decisões e as chamam de estratégias. Em grande parte das vezes, deveriam chamá-las de 'táticas' ou até 'decisões operacionais'. Mas qual é a diferença?

Em entrevista concedida para um importante canal de gestão, o 'papa' da estratégia empresarial, Michael Porter, esclareceu que não é estratégia adotar melhores práticas, implementar um novo software de gestão ou fazer outras tantas coisas que os gestores têm que fazer. Em "Estratégia competitiva", uma de suas obras mais importantes, Porter afirma que a estratégia competitiva é um conjunto de "ações ofensivas ou defensivas para criar uma posição defensável em uma indústria, para enfrentar com sucesso as cinco forças competitivas" (clientes, fornecedores, concorrentes, entrantes e substitutos).

O autor complementa que a estratégia é uma "solução única que reflete suas circunstâncias particulares". Conclui-se que estratégia é o caminho escolhido para se alcançar um objetivo que torna a sua organização diferente e mais competitiva com consistência. Uma decisão estratégica é aquela tomada em nível de diretoria, ou em nível superior, que determina "o que fazer" e não "como fazer". A decisão de "como fazer" é uma decisão tática, geralmente tomada em nível gerencial.

O que é estratégia empresarial
Tecnicamente falando, há três tipos básicos de estratégias empresariais:

1) Estratégias de desenvolvimento – dependem das capacidades da empresa e dos fatores ambientais (oportunidades e ameaças). Porém, uma vez adotadas, definirão as decisões da UEN – Unidade Estratégica de Negócios para sempre, talvez. Ou seja, são consideradas estruturais. Há dois tipos principais de estratégias de desenvolvimento, ou 'estratégias genéricas', segundo Porter:

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a) Diferenciação
Suas características principais são: tecnologia embutida nos produtos; personalização; imagem da marca de alto valor agregado; menor volume de vendas, com maior margem de lucro por unidade vendida.

b) Liderança em Custos
Suas características principais são: tecnologia embutida no processo para ganho de eficiência; padronização; produção em escala com o menor custo por unidade produzida; excelente sistema de distribuição.

Existe um terceiro tipo de estratégia de desenvolvimento chamado "enfoque" (ou nicho, ou ainda bloqueio), que consiste na escolha de um segmento alvo específico dentro de um mercado mais amplo. Por exemplo: determinada marca de calçados infantis pode produzir somente calçados femininos. Num mercado tão amplo como o calçadista, tal posicionamento restringe o alvo da empresa às meninas, somente (daí o nome enfoque). Porém, a marca consegue desenvolver processos ou produtos específicos para este segmento, que tende a preferi-la e tê-la como referência. A intenção de ter o domínio (ser líder) do segmento justifica chamar a estratégia também de 'bloqueio'.

2) Estratégias de crescimento – dependem de fatores conjunturais (crises econômicas ou mercadológicas, disponibilidade de recursos, mudanças demográficas, culturais, etc). Eis algumas opções:

  • Integração para frente – quando se estabelece uma nova UEN "uma casa" adiante na cadeia produtiva, tornando-se cliente de si mesmo;
  • Integração para trás – quando se estabelece uma nova UEN "uma casa" atrás na cadeia produtiva, tornando-se fornecedor de si mesmo;
  • Diversificação horizontal – quando se buscam novos clientes para os mesmos produtos;
  • Diversificação vertical – quando se desenvolvem novos produtos para os mesmos clientes;
  • Alianças estratégicas – joint ventures, fusões, compras e aquisições;
  • Concentração – eliminação de produtos do portfólio para concentrar-se naqueles mais lucrativos.

As estratégias de crescimento podem ser adotadas ou abandonadas com certa facilidade, dependendo das circunstâncias. Os objetivos principais das estratégias de crescimento são garantir competitividade e market share. O market share, ou participação de mercado, é considerado um dos principais indicadores de sobrevivência das empresas.

3) Estratégias competitivas – dependem da posição da empresa no mercado (market share) e são baseadas nas estratégias de guerra.

Todo mercado possui um líder – aquele que possui a maior participação de mercado. Em segundo e terceiro lugares estão os desafiantes. Todos os demais competidores com menor market share são chamados de seguidores. Assim como acontece num campo de batalha, o grupo maior e mais bem equipado costuma ser o alvo principal. Todos buscam uma parcela do seu mercado. Portanto, o líder precisa estar atento à defesa de seus flancos e deve manter-se à frente dos demais, principalmente com inovação.

Os desafiantes tentarão atacar o líder pelos flancos (pontos fracos), por cerco (diversas frentes simultaneamente) ou até em ataques frontais. Os desafiantes devem manter-se bem entrincheirados e podem tomar parcelas de mercado dos seguidores, até ganharem porte suficiente para assumir de vez a liderança.

Os seguidores devem evitar o líder. Geralmente, o imitam ou tentam aperfeiçoar seus processos e produtos. A estratégia de alianças estratégicas pode ser útil para seguidores que buscam uma posição de desafiante. As técnicas de guerrilha também são muito usadas pelos seguidores.

O que não é estratégia empresarial
Adotar certos conceitos como gestão do capital intelectual, gestão por diretrizes, lean manufacturing ou o balanced scorecard não é estratégia. Estes podem ser meios de se aprimorar a estratégia. O lean manufacturing, por exemplo, seria muito útil à estratégia de liderança em custos, uma vez que esta exige eficiência operacional. Porém, tecnicamente, não se trata de uma estratégia em si. Implementar um novo maquinário ou um novo tipo de matéria-prima, tampouco. Todas estas iniciativas constituem-se em táticas para que se desenvolva a estratégia.

Para elucidar melhor a questão, podemos comparar estratégia à decisão do capitão do navio de seguir para um dado continente, transportando um certo tipo de carga ou um grupo de passageiros, numa determinada época. As iniciativas a serem tomadas para viabilizar esta decisão estratégica do capitão deverão acontecer em nível tático: o engenheiro do navio, ou chefe de máquinas, poderá optar pela substituição de certos componentes do motor para ganho de potência; o Oficial decidirá sobre o trato com a carga no processo de carregamento, manutenção e descarregamento. Enfim, os colaboradores de terceiro e quarto escalão cuidarão das operações necessárias para que tudo aconteça conforme planejado.

No meio empresarial, ouvimos executivos afirmando que cuidarão das estratégias para que os resultados da semana sejam os melhores. Iniciativas que duram uma semana serão, provavelmente, táticas ou operacionais. O mesmo se pode afirmar sobre indicadores de desempenho. Os indicadores que exigem maior frequência de medição (diária, ou semanal) como unidades produzidas ou novos prospects (clientes em potencial) dificilmente serão indicadores estratégicos. Os indicadores estratégicos analisados em nível de presidência e direção são analisados mensalmente, semestralmente e até anualmente.

Concluindo, é desejável que os empresários e executivos compreendam o que é e o que não é estratégia, principalmente em se tratando das estratégias de desenvolvimento (diferenciação X liderança em custos). Sabemos que muitos empresários desconhecem a teoria das estratégias genéricas e sua importância na gestão empresarial. Porter alerta para o enorme risco de perda de competitividade das empresas que não se posicionam numa das duas estratégias genéricas. Quando mesclam muitas práticas da diferenciação e da liderança em custos, as empresas costumam se tornar inviáveis. Portanto, dedique algum tempo para pensar estrategicamente.

 


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