<p>Por Levi Carneiro *<br /> <br /> A maior empresa de produtos de consumo e maior anunciante do mundo iniciou, h&aacute; pouco mais de um m&ecirc;s, uma campanha de divulga&ccedil;&atilde;o de sua marca corporativa no Brasil. A Procter &amp; Gamble, depois de 22 anos no pa&iacute;s, realiza a sua primeira a&ccedil;&atilde;o de exposi&ccedil;&atilde;o institucional, sob a forma de uma enorme promo&ccedil;&atilde;o em parceria com um programa de grande audi&ecirc;ncia da Rede Globo.<br /> <br /> Aparentemente, poderia ser apenas uma jogada de marketing. Ali&aacute;s, uma jogada gigantesca, porque a promo&ccedil;&atilde;o tem v&aacute;rios &ldquo;avi&otilde;es&rdquo; carregados de pr&ecirc;mios. Mas na verdade &eacute; muito mais que isso: &eacute; um movimento particularmente significativo num processo global de valoriza&ccedil;&atilde;o da marca corporativa, iniciado h&aacute; poucos anos e que re&uacute;ne cada vez mais corpora&ccedil;&otilde;es. <br /> <br /> A ades&atilde;o da Procter &amp; Gamble a essa tend&ecirc;ncia tem um sentido especialmente simb&oacute;lico, pois esse conglomerado de marcas t&atilde;o importantes e diversas, como Ariel, Gillete, Duracell, Hipogl&oacute;s, Wella e Head &amp; Shoulders, era praticamente uma das &uacute;ltimas grandes organiza&ccedil;&otilde;es que ainda mantinha a sua marca-m&atilde;e numa regi&atilde;o de sombra ou de discreta exposi&ccedil;&atilde;o. <br /> <br /> Vale um par&ecirc;ntesis. N&atilde;o mencionar a marca-m&atilde;e de uma extensa fam&iacute;lia de produtos e optar por uma arquitetura de &ldquo;marcas independentes&rdquo; justifica-se, entre outros argumentos de seus praticantes, por duas raz&otilde;es. A primeira &eacute; a autonomia das diferentes unidades de neg&oacute;cios. A segunda &eacute; a n&atilde;o exposi&ccedil;&atilde;o da coexist&ecirc;ncia de neg&oacute;cios conflitantes num mesmo portif&oacute;lio.<br /> <br /> Mas o fato &eacute; que a id&eacute;ia de conferir visibilidade e pertin&ecirc;ncia &agrave; marca corporativa est&aacute; em franca expans&atilde;o. Caminha para o fim o &ldquo;sil&ecirc;ncio corporativo&rdquo; que tanto contrastava com a turbul&ecirc;ncia do marketing. O mundo mais transparente e dial&oacute;gico da internet impulsiona para isso: as organiza&ccedil;&otilde;es precisam apresentar a chancela corporativa que avaliza seus neg&oacute;cios e suas pr&aacute;ticas. N&atilde;o h&aacute; como esconder ou disfar&ccedil;ar essa credencial. Consumidores e demais p&uacute;blicos das empresas est&atilde;o atentos e cobrando para saber quem &ldquo;est&aacute; por tr&aacute;s&rdquo; dos produtos e servi&ccedil;os que utilizam.<br /> <br /> Al&eacute;m das raz&otilde;es de prote&ccedil;&atilde;o e defesa, h&aacute; motivos mais nitidamente econ&ocirc;micos para tal movimento. Quanto mais forte &eacute; o prest&iacute;gio e a reputa&ccedil;&atilde;o da marca corporativa, mais capacidade ela tem para gerar valor incremental para os neg&oacute;cios da companhia, seja facilitando a expans&atilde;o de produtos &ldquo;da mesma fam&iacute;lia&rdquo;, seja viabilizando ganhos de participa&ccedil;&atilde;o e margem ou at&eacute; mesmo propiciando economia na divulga&ccedil;&atilde;o conjunta e sin&eacute;rgica de produtos, que antes se promoviam separadamente. <br /> <br /> No entanto, a marca corporativa n&atilde;o &eacute; apenas um desenho, uma logomarca, um slogan ou um truque promocional para refor&ccedil;ar a presen&ccedil;a da companhia. A marca corporativa s&oacute; existe e pode transferir energia quando ela cumpre um roteiro b&aacute;sico, a saber:<br /> <br /> <strong>- tem uma promessa central</strong> &ndash; ou seja, uma s&iacute;ntese em uma palavra ou frase do que a marca deseja significar no cora&ccedil;&atilde;o e na mente dos seus p&uacute;blicos de relacionamento;<br /> <br /> <strong>- ostenta valores corporativos</strong> &ndash; s&atilde;o valores e cren&ccedil;as que inspiram os movimentos da corpora&ccedil;&atilde;o e est&atilde;o acima das caracter&iacute;sticas ou features de produtos;<br /> <br /> <strong>- expressa a postura da organiza&ccedil;&atilde;o </strong>&ndash; s&atilde;o atitudes que traduzem o posicionamento da marca, facilitam a sua identifica&ccedil;&atilde;o e criam a sua diferen&ccedil;a em rela&ccedil;&atilde;o &agrave; concorr&ecirc;ncia. <br /> <br /> Em outras palavras, uma marca corporativa &eacute; resultado de uma composi&ccedil;&atilde;o entre a miss&atilde;o da empresa, a cultura que det&eacute;m e a maneira como ela se comporta e quer ser percebida. Esse conjunto deve se estender para todos os s&iacute;mbolos, mensagens e experi&ecirc;ncias que fazem parte da marca. <br /> <br /> Surgem ent&atilde;o as perguntas: a campanha promocional da P&amp;G contempla no todo ou em parte esse roteiro? Qual &eacute; a promessa central da P&amp;G? Quais os valores e a postura da companhia? Como essa marca se relaciona com as marcas dos produtos da empresa e pode operar na transfer&ecirc;ncia de valor para eles?<br /> <br /> O presidente da ag&ecirc;ncia que fez a campanha disse que o conceito da promo&ccedil;&atilde;o &ldquo;Provou &amp;Gostou&rdquo; tem &ldquo;como objetivo ressaltar a qualidade dos produtos e a aprova&ccedil;&atilde;o dos consumidores&rdquo;. Bem, pode ser que a&iacute; realmente resida a promessa central da Procter &amp; Gamble.<br /> <br /> Mas evidentemente a campanha n&atilde;o responde a tudo e nem deve ter essa pretens&atilde;o. Talvez o site da P&amp;G, sua pol&iacute;tica de patroc&iacute;nios e outras manifesta&ccedil;&otilde;es importantes da organiza&ccedil;&atilde;o sejam elementos a mais nesse processo &ndash; espera-se, progressivo – de explicita&ccedil;&atilde;o da marca-m&atilde;e. <br /> <br /> No plano corporativo, os concorrentes muitas vezes se transformam em boas refer&ecirc;ncias. Por isso, nada melhor aqui do que lembrar a Unilever. Essa outra grande corpora&ccedil;&atilde;o tamb&eacute;m iniciou no Brasil, a partir do ano de 2004, um esfor&ccedil;o pioneiro de corporate branding. Um dos primeiros passos foi exatamente revelar, por meio de uma marca-conceito, o &ldquo;cora&ccedil;&atilde;o&rdquo;, a promessa central da organiza&ccedil;&atilde;o: vitalidade. Na sequencia, vieram outros movimentos que, passando inclusive por uma promo&ccedil;&atilde;o, culminam hoje com uma grande a&ccedil;&atilde;o de compromisso da marca com a sustentabilidade (&ldquo;Cada gesto conta&rdquo;).<br /> <br /> Depois de alguns anos dedicados a esse trabalho, a Unilever est&aacute; colhendo frutos do reconhecimento e do poder de transfer&ecirc;ncia de prest&iacute;gio de sua marca, conforme atestam depoimentos de seus dirigentes. Assim como tem acontecido com v&aacute;rias outras organiza&ccedil;&otilde;es no Brasil e mundo: General Electric, Philips, Votorantim, Nestl&eacute;, Coca-Cola Brasil, Johnson&amp;Johnson, para citar algumas. <br /> <br /> Em todos esses casos, &eacute; poss&iacute;vel assinalar certos procedimentos que se imp&otilde;em na abordagem da marca corporativa: 1) n&atilde;o &eacute; algo que se constr&oacute;i da noite para o dia, &eacute; trabalho cont&iacute;nuo e permanente; 2) deve incorporar promessas e valores que est&atilde;o al&eacute;m do marketing e pertencem aos fundamentos da organiza&ccedil;&atilde;o; 3) n&atilde;o se dirige apenas para consumidores, mas dialoga com todos os stakeholders; 4) n&atilde;o &eacute; responsabilidade de um s&oacute; departamento, mas precisa envolver toda a organiza&ccedil;&atilde;o, a come&ccedil;ar pela alta dire&ccedil;&atilde;o. <br /> <br /> Como bem assinala o especialista ingl&ecirc;s John Balmer, esse foco na marca corporativa, mais do que resultados imediatos para a empresa, deve buscar a gera&ccedil;&atilde;o de valor para todos que com ela interagem e relacionam. Pelas propor&ccedil;&otilde;es da campanha promocional realizada pela Procter &amp; Gamble, fica claro que a empresa &ldquo;provou &amp; gostou&rdquo; do corporate branding. S&oacute; cabe torcer para que continue nesse caminho. Provando e gostando cada vez mais. <br /> <br /> * Levi Carneiro &eacute; Diretor Associado do Grupo Troiano de Branding e diretor da Id&eacute;ia Comunica&ccedil;&atilde;o Empresarial.&nbsp;&nbsp; </p>
O caso da marca corporativa da Procter & Gamble
9 de novembro de 2010