<strong>Mercado popular e estrat&eacute;gia de marketing das empresas: potencial distante ou oportunidade efetiva?<br /></strong><br />Por Renata Giovinazzo Spers e James Terence Coulter Wright*<br /><br />As classes C, D e E, que comp&otilde;em a maioria da popula&ccedil;&atilde;o do Brasil, s&atilde;o extremamente relevantes do ponto de vista social e econ&ocirc;mico, representando uma enorme parcela de mercado a ser atendida com produtos e servi&ccedil;os espec&iacute;ficos para as suas necessidades e a renda dispon&iacute;vel. Diante da import&acirc;ncia deste segmento, muitas empresas t&ecirc;m atuado para atend&ecirc;-lo e a m&iacute;dia vem mostrando, m&ecirc;s a m&ecirc;s, um n&uacute;mero crescente de casos de sucesso no atendimento ao p&uacute;blico de baixa renda, casos como o da cervejaria Belco, Refrigerantes Conven&ccedil;&atilde;o e Casas Bahia.<br /><br />Mas embora muito se fale do potencial deste mercado, com casos ilustrando o sucesso de algumas empresas, qual &eacute; o efetivo desempenho das empresas que atendem as camadas da popula&ccedil;&atilde;o com baixa renda? E quais s&atilde;o os fatores de sucesso e o mix de marketing mais adequado para atender a este segmento?<br /><br />Mais do que apenas tomar esse mercado como sendo um &ldquo;mercado de massa&rdquo;, onde as empresas competem com foco somente em pre&ccedil;o, &eacute; necess&aacute;rio entender como as empresas que atuam junto &agrave;s classes C, D e E t&ecirc;m alcan&ccedil;ado sucesso no atendimento a tais segmentos e como as suas estrat&eacute;gias podem se manter sustent&aacute;veis, garantindo vantagens com rela&ccedil;&atilde;o &agrave; concorr&ecirc;ncia e gerando resultados superiores ao longo do tempo.<br /><br />Com rela&ccedil;&atilde;o ao desempenho obtido por empresas focadas no mercado popular, pode-se dizer que &eacute; excelente, n&atilde;o representando somente um bom potencial, mas de fato uma oportunidade para as empresas alcan&ccedil;arem um crescimento superior. Pesquisa realizada com 75 empresas com abrang&ecirc;ncia nacional e em diversos setores de bens de consumo (alimentos, bebidas e fumo, higiene e limpeza, vestu&aacute;rio, eletrodom&eacute;sticos e com&eacute;rcio varejista) mostra que empresas com foco em bens populares tiveram um crescimento real m&eacute;dio maior do que as empresas que atuam no mercado de classes A e B, em um per&iacute;odo de 5 anos. Este crescimento observado &eacute; especialmente significativo quando consideramos que o crescimento do PIB no mesmo per&iacute;odo foi de 1,71% ao ano. <br /><br />A pesquisa tamb&eacute;m mostra que as empresas com foco no segmento popular tiveram uma lucratividade m&eacute;dia e um resultado operacional l&iacute;quido superiores aos resultados das empresas que atendem prioritariamente ao segmento de alta renda, evidenciando que a lucratividade superior obtida pelas empresas que atuam com bens populares n&atilde;o resulta de ganhos financeiros, mas sim de suas opera&ccedil;&otilde;es efetivas.<br /><br />Estes resultados confirmam o potencial do mercado popular no Brasil, podendo atrair mais investimentos para este segmento e alimentar um c&iacute;rculo virtuoso onde estas empresas apresentam bons resultados, ao mesmo tempo em que oferecem produtos adequados a uma popula&ccedil;&atilde;o de baixa renda. Este pode ser um caminho para que outras organiza&ccedil;&otilde;es brasileiras possam consolidar estrat&eacute;gias aut&ecirc;nticas, que favore&ccedil;am uma atua&ccedil;&atilde;o bem-sucedida junto aos mercados de baixa renda do Brasil e do mundo. Neste sentido, simplesmente oferecer produtos mais baratos n&atilde;o gera uma vantagem competitiva sustent&aacute;vel para as empresas, &eacute; preciso que haja uma estrat&eacute;gia consistente, com uma combina&ccedil;&atilde;o adequada entre o posicionamento da empresa e seu mix de marketing para atender ao p&uacute;blico de baixa renda, ou seja, ao priorizarem este segmento de mercado, as empresas adotam um posicionamento que se reflete nos seus pre&ccedil;os, produtos, promo&ccedil;&atilde;o e ponto de venda.<br /><br />As empresas que atuam no mercado de bens populares possuem um posicionamento de pre&ccedil;os baixos para a maioria de seus produtos, em rela&ccedil;&atilde;o aos concorrentes, e consideram este como um importante fator de competitividade, buscando ser uma das ou a principal ofertante dos produtos mais simples e baratos do mercado. Entretanto, conforme j&aacute; mencionado, somente o pre&ccedil;o baixo n&atilde;o &eacute; suficiente para garantir a sustentabilidade dos resultados destas empresas. A forma como determinam seus outros elementos de marketing &eacute; fundamental para garantir estes baixos pre&ccedil;os e tamb&eacute;m o sucesso das empresas ao longo do tempo.<br /><br />Quanto &agrave;s caracter&iacute;sticas do produto, os bens populares s&atilde;o padronizados e simples, sendo que a empresa dispende poucos esfor&ccedil;os em termos da amplitude da linha de produtos, ao passo que as empresas que atuam junto &agrave;s classes A e B apresentam uma maior variedade de produtos, com uma maior amplitude de suas linhas. Al&eacute;m de mais padronizados, os produtos populares s&atilde;o mais simples, embutindo uma tecnologia j&aacute; conhecida e difundida, que se reflete em baixos investimentos em pesquisa tecnol&oacute;gica avan&ccedil;ada e um comportamento imitativo quanto ao uso de tecnologias em produtos e processos. Quanto ao n&iacute;vel de qualidade, as empresas de sucesso buscam oferecer produtos que atendam a todos os requisitos quanto &agrave;s mat&eacute;rias-primas utilizadas, especifica&ccedil;&otilde;es e observ&acirc;ncia das toler&acirc;ncias em termos de qualidade, contrariando o senso-comum de que o produto popular &eacute; um produto de baixa qualidade.<br /><br />Quanto &agrave; promo&ccedil;&atilde;o, a empresa que atua no segmento popular n&atilde;o busca a diferencia&ccedil;&atilde;o da sua marca como principal fator competitivo, evitando despesas elevadas com publicidade, for&ccedil;a de vendas, embalagem ou outros elementos n&atilde;o essenciais caros. Diferentemente das empresas orientadas para as classes A e B que desenvolvem a identifica&ccedil;&atilde;o da marca junto ao consumidor final, as empresas populares buscam a diferencia&ccedil;&atilde;o por meio de uma pol&iacute;tica de apoio aos seus canais de distribui&ccedil;&atilde;o, e pontos de venda, visando a promo&ccedil;&atilde;o de sua marca junto ao consumidor final, fornecendo material promocional, folhetos explicativos, posters, brindes e promo&ccedil;&otilde;es. Esta estrat&eacute;gia &eacute; interessante, pois al&eacute;m dos canais de comunica&ccedil;&atilde;o tradicionais exigirem maiores investimentos, podem n&atilde;o ser eficazes para atingir as classes C, D e E. Os consumidores est&atilde;o pulverizados nas periferias e compram muitas de vezes em pequenos mercados e mercearias, sendo muito mais vantajoso investir neste contato direto com o cliente nas lojas.<br /><br />Por outro lado, nestes pontos de venda as empresas proporcionam aos seus clientes um atendimento b&aacute;sico, com uma menor quantidade de servi&ccedil;os auxiliares e sofisticados, tais como recep&ccedil;&atilde;o, assist&ecirc;ncia t&eacute;cnica, estacionamento, cr&eacute;dito, entre outros. Muitas das marcas n&atilde;o t&ecirc;m lojas pr&oacute;prias e oferecem aos seus consumidores um servi&ccedil;o pouco sofisticado. Embora tenham uma preocupa&ccedil;&atilde;o em oferecer servi&ccedil;os auxiliares em algum grau, n&atilde;o fazem altos investimentos nos servi&ccedil;os diferenciados, como &eacute; o caso das empresas voltadas para o mercado de luxo e mercado de alta renda, que investem pesadamente nesta diferencia&ccedil;&atilde;o como fator de competitividade.<br /><br />Por meio desta composi&ccedil;&atilde;o de produtos simples e padronizados, promo&ccedil;&atilde;o via ponto de venda e servi&ccedil;os auxiliares b&aacute;sicos, as empresas conseguem uma redu&ccedil;&atilde;o nos seus custos que vai al&eacute;m do que a redu&ccedil;&atilde;o nos custos envolvidos nos processos de produ&ccedil;&atilde;o, instala&ccedil;&otilde;es, equipamento e m&eacute;todos utilizados. Estes fatores combinados t&ecirc;m uma l&oacute;gica e uma consist&ecirc;ncia interna, permitindo que as empresas pratiquem pre&ccedil;os mais baixos, mas com excel&ecirc;ncia nos resultados e, principalmente, com uma vantagem competitiva que pode ser sustentada ao longo do tempo.<br /><br />Alcan&ccedil;ar esta integra&ccedil;&atilde;o entre a estrat&eacute;gia, posicionamento e elementos de marketing representa a chave para o sucesso no segmento de bens populares, transformando este grande potencial de mercado em uma oportunidade efetiva de atua&ccedil;&atilde;o, com a gera&ccedil;&atilde;o de novos neg&oacute;cios e a obten&ccedil;&atilde;o de excelentes resultados para a empresa. <br /><br />* Renata Giovinazzo Spers &eacute; Doutoranda em administra&ccedil;&atilde;o pela FEA-USP e doutoranda visitante da Universidade de Cambridge. Pesquisadora do Programa de Estudos do Futuro &ndash; FIA (Funda&ccedil;&atilde;o Instituto de Administra&ccedil;&atilde;o) e professora assistente do MBA Executivo Internacional &ndash; FIA. Conato: [email protected] e <a href="http://www.fia.com.br/profuturo" target="_blank">www.fia.com.br/profuturo</a><br /><br />James Terence Coulter Wright &eacute; Doutor em administra&ccedil;&atilde;o. Professor de administra&ccedil;&atilde;o de empresas na FEA-USP (Pol&iacute;tica de Neg&oacute;cios e Economia de Empresas). Coordenador do Programa de Estudos do Futuro &ndash; FIA (Funda&ccedil;&atilde;o Instituto de Administra&ccedil;&atilde;o) e do MBA Executivo Internacional &ndash; FIA. Conato: [email protected] e <a href="http://www.fia.com.br/profuturo">www.fia.com.br/profuturo</a>
Mercado popular e estratégia de marketing das empresas: potencial distante ou oportunidade efetiva?
3 de abril de 2006