Paradoxo de Kotler
Paradoxo de Kotler
Por Redação - 19/12/2007 Artigos
<p><strong>Paradoxo de Kotler</strong></p><p>Por Mois&eacute;s Efraym*<br />&nbsp;<br />H&aacute; muitos anos a Tostines veiculou uma s&eacute;rie de comerciais na forma de desenhos animados que fixaram no imagin&aacute;rio popular o que ficou conhecido como Dilema Tostines. Num desses comerciais uma esp&eacute;cie de monge sufista meditava em posi&ccedil;&atilde;o de l&oacute;tus no alto de uma montanha enquanto ela era escalada por um persistente disc&iacute;pulo que, ao conseguir alcan&ccedil;ar o ponto mais alto onde o mestre se encontrava meditando, faz a seguinte pergunta: &ldquo;Mestre, Tostines vende mais por que &eacute; fresquinho ou &eacute; fresquinho por que vende mais? Me d&aacute; uma luz, mestre!&rdquo;. Sem se abalar com a interfer&ecirc;ncia do disc&iacute;pulo o mestre apenas levanta a pestana do olho direito fazendo cair um raio do c&eacute;u que chamusca completamente o disc&iacute;pulo.<br />&nbsp;<br />Coisa semelhante aconteceu com a entrevista concedida pelo guru do marketing Philip Kotler a alguns diretores de marketing brasileiros. Depois de repetir &ndash; com a autoridade do pr&oacute;prio Verbo Encarnado &ndash; obviedades publicit&aacute;rias conhecidas at&eacute; por quem n&atilde;o &eacute; do ramo, ele conclui a entrevista (que limitou a seis perguntas das quais tr&ecirc;s ele embutiu na &uacute;ltima resposta) com a seguinte senten&ccedil;a et&eacute;rea: &ldquo;a l&oacute;gica do marketing carrega uma contradi&ccedil;&atilde;o inerente: uma empresa falhar&aacute; se n&atilde;o inovar e &eacute; prov&aacute;vel que ela falhe se inovar tamb&eacute;m&rdquo;.</p><p>Depois dos disc&iacute;pulos subirem a montanha e conseguirem um &agrave; parte com o mestre para dirimirem suas mais profundas d&uacute;vidas, o mestre levanta a pestana, olha para eles com indiferen&ccedil;a, e ainda lhes devolve o dilema para o qual buscavam solu&ccedil;&atilde;o sob a forma do que est&aacute; sendo chamado aqui de Paradoxo de Kotler. Para completar, o guru acrescenta a insigne declara&ccedil;&atilde;o: &ldquo;Por essa raz&atilde;o, cada empresa precisa encontrar seus pr&oacute;prios caminhos para escapar deste grande dilema&rdquo;. Em linguagem popular isso quer dizer: salve-se quem puder! D&aacute; teu jeito! Mas isso n&atilde;o &eacute; o pior. O pr&oacute;prio conte&uacute;do do Paradoxo de Kotler &eacute; o raio que ele faz cair sobre as cabe&ccedil;as dos inconsolados disc&iacute;pulos.</p><p>Certamente a &uacute;ltima declara&ccedil;&atilde;o &ndash; seja na formula&ccedil;&atilde;o cl&aacute;ssica de Kotler, seja na vers&atilde;o popular descrita acima &ndash; foi assimilada por seus interlocutores. Quanto ao Paradoxo, esse tem implica&ccedil;&otilde;es que se forem explicadas, podem chamuscar menos. Em l&oacute;gica, a senten&ccedil;a de Kotler &eacute; chamada de Teoria da Decis&atilde;o. Isso quer dizer o seguinte: se h&aacute; duas decis&otilde;es poss&iacute;veis (inovar ou n&atilde;o) como estar seguro de que a op&ccedil;&atilde;o feita foi a melhor? Ou seja, como sair da forquilha em que o paradoxo de Kotler pode ter colocado seus interlocutores? O que vale a pena fazer? &Eacute; claro que o &ldquo;d&aacute; teu jeito!&rdquo; n&atilde;o &eacute; uma resposta satisfat&oacute;ria.</p><p>Certamente o leitor j&aacute; deve ter ouvido falar na Aposta de Pascal, certo? Ela consiste no seguinte: Como n&atilde;o podemos saber se Deus existe, &eacute; mais &ldquo;neg&oacute;cio&rdquo; acreditar ou n&atilde;o na exist&ecirc;ncia dele? N&atilde;o se esque&ccedil;a que se trata de uma aposta que pode definir o destino do apostador! Pascal conclui que devemos apostar na cren&ccedil;a em Deus. Por qu&ecirc;? Ora, se Deus existir ser&aacute; melhor se considerarmos a perspectiva da felicidade eterna que se abre aos crentes; se Ele n&atilde;o existir, tamb&eacute;m ganhamos pelo simples fato de a cren&ccedil;a nos afastar de coisas &ldquo;mundanas&rdquo; que podem prejudicar nossa boa exist&ecirc;ncia.</p><p>Em l&oacute;gica, uma escolha &eacute; chamada dominante em rela&ccedil;&atilde;o a uma outra se &eacute; t&atilde;o boa quanto &agrave; outra em todos os resultados e melhor do que a outra em alguns. Por isso, Pascal aposta que acreditar &eacute; melhor: se eu n&atilde;o acreditar, eu posso estar perdendo caso Ele exista; se eu acreditar eu posso n&atilde;o ganhar, mas tamb&eacute;m n&atilde;o perco nada. Por isso, a escolha dominante no caso do Paradoxo de Kotler &eacute; a de que as empresas devem investir em inova&ccedil;&otilde;es: se n&atilde;o investir, n&atilde;o abocanha parte do mercado sedento por novidades e ainda corre o risco de desaparecer (queimar no fogo do Inferno caso Deus exista); se investir, pode ser que a concorr&ecirc;ncia n&atilde;o permita um retorno satisfat&oacute;rio, mas pelo menos vai estar no &ldquo;bal&atilde;o de ar&rdquo; do investimento e pode, quem sabe, encontrar no curso da aposta feita aquela id&eacute;ia genial que pode render muitos zeros na receita do pr&oacute;ximo ano fiscal (o para&iacute;so).</p><p>No caso de Kotler, as duas escolhas s&atilde;o n&atilde;o-dominantes (pessimistas). Se o Paradoxo de Kotler tivesse valor universal, a Teoria Matem&aacute;tica da Comunica&ccedil;&atilde;o de Claude Shanon que tornou poss&iacute;vel a linguagem bin&aacute;ria da inform&aacute;tica n&atilde;o seria poss&iacute;vel, pois segundo Shanon 1Bit de informa&ccedil;&atilde;o &eacute; igual &agrave; escolha feita entre duas op&ccedil;&otilde;es (0 e 1). Ou seja, o paradoxo de Kotler n&atilde;o produz informa&ccedil;&atilde;o! Sendo pessimistas com rela&ccedil;&atilde;o ao futuro, como vamos construir o sentido de nossas a&ccedil;&otilde;es no presente?</p><p>Um americano bem posicionado pode ser pessimista em rela&ccedil;&atilde;o &agrave;s inquieta&ccedil;&otilde;es do mercado brasileiro, mas o mercado brasileiro deve ser otimista em um momento em que um dos principais assuntos da pauta do marketing &eacute; a regulamenta&ccedil;&atilde;o legal da profiss&atilde;o e que tem, entre outras coisas, o poder definir o futuro desse mesmo mercado. &Eacute; uma quest&atilde;o de Comunica&ccedil;&atilde;o Social.</p><p>Vida &eacute; movimento, Devir, Risco, s&oacute; &ldquo;falha&rdquo; quem n&atilde;o age. Mestres s&atilde;o especialistas em jogar raios na nossa cabe&ccedil;a. E pra isso eles s&oacute; precisam levantar uma pestana. &Eacute; por isso que Nietzsche diz: &ldquo;Retribui-se mal a um mestre quando se permanece sempre e t&atilde;o somente um disc&iacute;pulo&rdquo;. Guardado o devido respeito que &agrave;s vezes os mestres inspiram, precisamos fazer como David Carradine na s&eacute;rie Kung Fu: colocar a mochila nas costas e decidir que caminho seguir. Melhor do que se submeter a &ldquo;autoridade&rdquo; de quem s&oacute; diz o que a gente j&aacute; sabe ou que talvez sinta um prazer m&oacute;rbido em nos chamuscar.</p><p>* Mois&eacute;s Efraym &eacute; fil&oacute;sofo.</p><p><a href="../2006/ver_entrevistas.asp?cod=1780" target="_blank"><strong>Leia a entrevista exclusiva com Kotler que motivou este artigo</strong></a> </p>